Pós-pandemia: o que sobrou?

E agora, José?

A pandemia acabou,

A luz quase apagou,

O cliente sumiu,

O mercado esfriou…

 

Muitos empresários acreditavam que, após a fase pandêmica, a bonança viria – afinal, como todos queriam crer, existiria uma demanda represada que seria personificada em uma avassaladora ânsia de consumo. Até houve um pequeno entusiasmo em meados de 2022, mas no mesmo ano tivemos campanha eleitoral, eleição, Copa do Mundo e fim de ano.

Com o novo ano que chegou, ainda com resquícios de promessas e crenças do passado recente, 2023 logo mostrou a sua cara de segunda feira e com gosto de ressaca. Sim, as notícias sobre as oscilações do mercado, pedidos de recuperação judicial de grandes players, juros cada vez mais altos, dinheiro mais caro, consumidores sofrendo cada vez mais para pagar suas contas básicas de consumo.

Por mais desafiador que este cenário se apresenta, muitos irão dizer que eu estou reclamando sem justificativa, pois a logística foi um dos segmentos que mais cresceu no antes, durante e logo após a pandemia. Isso é verdade, mas o crescimento não foi nada além do que naturalmente iria acontecer. O comportamento do consumidor, que inclui a digitalização das compras, estava em processo de mudança gradual e o Covid-19 só fez com que o gradual se tornasse imperativo.

A Logística teve seu momento de “vacas gordas” entre 2020 e 2022, mas começou o ano assim como outros segmentos da economia… demitindo e vendo os números caírem. Com a crise que estamos vivendo, nenhum segmento consegue se manter. E essa é uma constatação.

Mas o que tem levado a logística a sofrer? A resposta é certa! Estamos sendo impactados pelo mau momento no varejo. Muitas empresas varejistas estão quebrando ou estão pedindo recuperação judicial para não falir. Temos inúmeros casos de varejistas do setor de vestuário, lojas de departamentos e até alimentos passando por dificuldades financeiras. Segundo dados da Serasa Experian, a alta nos pedidos de Recuperações Judiciais representa 37,3% quando comparamos com janeiro de 2022 e de quase 90% comparado com janeiro de 2021. Como um péssimo círculo vicioso, a crise gera mais crise, porque gera desconfiança no mercado fazendo o consumo se retrair e prejudicando outros segmentos.

Mas como chegamos nesse ponto? E como vamos sair dessa? A primeira pergunta eu ainda me arrisco a responder, mas a segunda eu deixo para os economistas e as cartomantes que podem ver o futuro.

Durante a pandemia, todos os mercados, com medo de uma crise financeira sem precedentes abriram os cofres, ou seja, deram crédito para estimular o consumo e principalmente para que as pessoas e empresas sobrevivessem – e de fato essas medidas ajudaram alguns. As micro e pequenas empresas ou aquelas que já apresentavam problemas financeiros quebraram logo no primeiro momento, pois não tinham folego e não aguentaram a pandemia passar. As empresas que superaram o COVID, só sobreviveram, pois tomaram um remédio chamado crédito. Esse remédio parece bom no início, mas apresenta um sério efeito colateral conhecido como “uma hora a conta chega”, e ela chegou, e chegou no pior dos momentos… no momento de desconfiança nos mercados, juros altos, inflação e inadimplência.

No setor de logística a expectativa não foi diferente. Com dinheiro no bolso (crédito) e com a expectativa de crescimento e de vendas, houve a necessidade de contratação de mão de obra e tivemos o “boom” logístico em plena pandemia. Mas em 2023 tudo mudou. Empresas grandes do setor, como Loggi e Amazon iniciaram o ano demitindo e as pequenas empresas também acompanharam essa tendencia do mercado.

Perceba que, em um primeiro momento, era natural que houvesse demissão. Pois o mercado estava inchado e precisava se equilibrar entendendo a nova realidade, mas passados quatro meses o fato é que ainda não conseguimos entender qual é a nossa real capacidade e isso sim assusta. Afinal, se os varejistas que são grandes consumidores dos serviços de logística estão em crise, existe ainda a possibilidade real de aumento da tributação dos importados que deve respingar na logística fazendo os números caírem.

Temos também o setor automobilístico dando férias aos seus trabalhadores, pois os automóveis estão com preços indecentes o que freia o consumo e paralisa toda uma cadeia de produção da qual a logística faz parte.

Tudo o que foi exposto aqui é de conhecimento de todos e não é novidade, mas a pergunta que fica é: O que fazer? Infelizmente a resposta não é das melhores… temos que fazer o que fazemos no mar quando nos deparamos com uma onda grande a nossa frente, é preciso mergulhar e tentar atravessar. Na prática isso significa que temos que mergulhar nos números das nossas empresas, procurar onde podemos reduzir custo e melhorar eficiência, temos que buscar parcerias, parcelar as dívidas negociando incansavelmente e, principalmente, entender o que o nosso consumidor precisa entregando mais a um custo menor.

A boa notícia é que a crise vai passar! Nós brasileiros somos especialistas em crises. Só precisamos mais uma vez de resiliência e de redobrar o foco para fazer o que precisa ser feito sem distrações. Seguir é a opção.

 

* Início baseado no poema de Carlos Drummond de Andrade – José.

 

Fontes:

https://www.sosconsumidor.com.br/noticias-56822-mais-70-empresas-entraram-pedido-falencia-em-janeiro-2023

https://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2023/02/20/empresas-tem-maior-onda-de-recuperacao-judicial-em-3-anos.htm

 

 

Renata Delgado é Controller Financeiro na Avante Assessoria Empresarial. É consultora especialista em controladoria e gestão. Com experiência em empresas de pequeno porte e multinacionais, atua com agilidade na reestruturação de empresas de todos os segmentos.

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